terça-feira, 9 de julho de 2019

privilégio

serviu-me de café e disse-me para não me preocupar com os lençóis nem com o frigorífico nem com os vidros das janelas. pediu-me para a relembrar quanto levava à hora e deixou-me uma nota de 50 debaixo do copo de água filtrada. i don't care if you don't need to stay so long today. são 14€ de gorjeta.
uma colega arranjou uma casa para limpar a cada 2 semanas por 2h. pediram-lhe para não limpar a casa de banho e dão-lhe 40€ cada vez que lá vai. 

isto é ter noção de privilégio.

quinta-feira, 4 de julho de 2019

a minha barriga

ao mesmo tempo, pusemos o nosso programa preferido da alemanha a tocar nas colunas de um quarto do lado norte e de um quarto do lado sul. bebo chá de lúcia-lima porque, mais cedo, encontrei cerejas no mercado a 1,99 o kg. comi todas as cerejas que consegui e dói-me a barriga. mas a minha mãe sempre me disse que o melhor do mundo são as cerejas. e eu acredito nela. hoje tenho o melhor do mundo às voltas na minha barriga. é bom estar mal disposta e ter uma razão para não pensar em nada para além da minha barriga.

sábado, 29 de junho de 2019

porque hoje é sábado

porque hoje é sábado, dormi até tarde. acordei com uma companheira de casa a cantar no chuveiro e fiquei contente. na cozinha havia ovos mexidos e o café delta ainda não acabou. hoje fez calor outra vez e eu esperei o final da tarde para sair de bicicleta até moabit. tentei ir sempre pelo canal, mas não resultou muito bem. no caminho passei pela haus der kulturen der welt e nem foi tarde nem foi cedo para entrar. a miúda na bilhteteira comia uma melancia e tinha pêlos grandes debaixo dos braços, como eu. pedi-lhe o bilhete para o milton nascimento. na verdade é para a luedji luna, que vai abrir o concerto, mas o destque é para o milton e foi isso que disse. ela perguntou-me se sou estudante e eu disse que sou. não me pediu o cartão e tive desconto. 4€. trouxe a programação da cinemateca e segui passando a ponte onde começa moabit. as luzes estavam todas ligadas e o frigorífico estava cheio de cervejas. 16. bebi logo uma e pus duas na mochila. estava tudo a correr bem até que recebo uma mensagem no whasapp do proprietário com uma grande lista de tudo o que tenho de checkar antes de sair da casa e uma pergunta: como é possível sempre me esquecer da louça na máquina? desta vez não me esqueci da louça na máquina e ainda trouxe um copo que estava molhado e não podia utilizar o pano lavado para o limpar. o caminho de volta pelo canal resultou melhor. levei cerca de uma hora. cheguei a casa podre, mas no terraço havia comida, bebida e pessoas. arrastei-me até elas e um companheiro de casa disse a brincar working class hero. o joão também lá estava e falámos um bocadinho do henry miller, do kerouac, da anais nin. disse-lhe como hoje me custa lê-los e porquê. disse-lhe deste blog. talvez ele vá ler isto. ouço foguetes. não sei porquê. o vinicius de moraes era um grande machista, mas hoje é sábado e amanhã é domingo.

sexta-feira, 28 de junho de 2019

pássaros

às sextas-feiras vou sempre limpar o meu sítio preferido. fica em britz, numa zona industrial onde não há vizinhos. 40 minutos de bicicleta. no verão é muito bom. é casa-armazém-escritório-oficina. atrás tem um pequeno jardim com uma gaiola gigante cheia de pássaros lindos. no armazém também há pássaros grandes feitos de estrume. não cheiram mal. à frente há um caminho de plantas que nos guia até à porta. gosto de as regar descalça e de mangueira. também gosto de dar comida e água aos passarinhos. tenho sempre medo que fujam, mas não fogem. gosto de lá ir porque quem lá mora tem bom coração. é onde recebo menos, mas nem me importo muito. troco sempre os lençóis de cima e de baixo, faço máquinas de roupa e de louça e nunca me esqueço de a tirar. normalmente ponho música nas colunas, mas hoje não pus porque um estava meio a dormir e o outro numa conversa de skype que alternava o inglês com o italiano com aquela agilidade a que a matilde nos habituou. no caminho de casa, ao passar na karl-marx, vi a sara no balcão e chamei-a. ciao, bella! fomos comer um halloumi im brot no meu sítio preferido, ali na rathaus neukoelln, e acabámos a beber uma cerveja pequena a 1€, numa carrinha transformada em biergarten, na wildenbruchstrasse. falámos de coisas boas e também do krankenkasse. muito acima das nossas cabeças, os pássaros faziam a dança do final da tarde e eu pensei: mesmo sem krankenkasse, os pássaros seguem cantando todas as tardes de verão.

quinta-feira, 27 de junho de 2019

batatas

hoje não fez tanto calor e não precisei de utilizar o s-bahn. fui só ali até neukoelln. 30 minutos de bicicleta. 20 se for a speedar, mas não fui. descobri imensas coisas atrás do armário e da máquina de lavar roupa, por baixo do fogão e do sofá. meias sem par embrulhadas num fofinho rolo de cotão, um penso diário não utilizado, um creme de mãos com cheiro a pêssego já com crosta na abertura, fusilli, um peão, bocados de pão duro, tampas de frascos. até tive tempo de olhar para os livros na estante e trouxe emprestado o fala, amendoeira, do drummond. o livro que eu estive quase para comprar na livraria cultura, em são paulo. hoje vi uma fotografia do daniel no facebook. às vezes tenho saudades de lhe escrever. ao fim da tarde, a caminho de britz, pensei em batatas. pensei no empadão da minha mãe. foi estranho porque eu nunca penso em batatas. mas hoje, ao chegar a casa, tinha um grande empadão à minha espera. 

quarta-feira, 26 de junho de 2019

está tudo bem

é tão engraçado o s-bahn não ter ar condicionado. acho que hoje fizeram 37º em berlim. eu tomei o s-bahn três vezes. não paguei bilhete uma. um bilhete custa 2,80. se se compram logo 4 bilhetes fica a 2,25. o passe são 81€. 59,10 se só se utilizar a partir das 10 da manhã. às 10 da manhã eu já precisava de estar em moabit. é lá que fica a primeira casa que fui limpar. quando terminei já passava da hora do almoço. entrei numa gelataria porque os gelados na alemanha são bons e mais baratos que em portugal, mas nesta gelataria a bola era 30 cêntimos mais cara que na gelataria do meu bairro e torci o nariz. mas não era mesmo boa ideia comer gelado ao almoço. as pessoas que já tinham passado na primeira casa a pegar a chave estavam lá sentadas a comer waffles com bolas de gelado e toppings. eu disse oi e que já podiam ir. passei a passadeira e entrei no shopping que anunciava ter um edeka. comprei uma salada de plástico, uma molho de iogurte, um papo seco e duas ameixas e sentei-me no degrau cá fora a comer. depois voltei a subir a ponte e entrei no s-bahn sem tempo de picar o bilhete e mesmo a tempo das portas me agarrarem o tornozelo. fiquei a largar fucks e ninguém se mexeu. o meu tornozelo ficou magoado e eu também. o senhor condutor deve ter visto as minhas figuras na câmara e voltou a abrir as portas. eu tentei play it cool e comecei a olhar o mapa como se não soubesse para onde ia. um menino de uns 10 anos veio ter comigo desde o outro lado da carruagem e perguntou-me se estava bem. então eu sorri, agradeci-lhe, disse que sim, está tudo bem. desci em prenzlauer berg e fui limpar a segunda casa que estava bem cagada, mas a contar pelos travesseiros eram 6 pessoas. agora lembrei-me que me esqueci de tirar a louça da máquina. 

privilégio

serviu-me de café e disse-me para não me preocupar com os lençóis nem com o frigorífico nem com os vidros das janelas. pediu-me para a rele...